Um "ninho vazio", cheio de oportunidades

28-07-2022

Celebrámos no passado dia 26 de julho, o dia dos avós. Tendo em consideração a fase do ciclo da vida da família em que a maioria dos avós se encontra, não será despropositado falar do "síndrome do ninho vazio". 

Fazendo um paralelismo com o que acontece aos pássaros quando os filhotes voam do ninho e não voltam, rumo a novas paragens, a etapa de vida familiar em que os filhos vão construir a sua própria vida, desafia a vários níveis, a qualidade emocional dos pais e a qualidade da relação do casal. Entretanto a "síndrome do ninho vazio", pode apresentar-se como uma grande oportunidade para fortalecer a relação do casal e como uma nova fase de reestruturação das questões individuais.


A prevenção das possíveis dificuldades neste período da vida inicia-se já desde quando o casal se casa. Sabemos que, um dos grandes desejos e objetivos do casal, é o de gerar filhos aumentando a sua prole. Mas ao projectar a vida com o nascimento dos filhos, o casal deve também desde o início do casamento, preparar-se para o momento em que esses mesmos filhos sairão de casa e se autonomizam. Se, por um lado, os filhos passam a ser grandes componentes da vida a dois, por outro há a necessidade do casal estruturar o percurso familiar, de forma a que suas vidas sejam enriquecidas e as crises da meia-idade e velhice possam ser vir a ser minimizadas.


Para quem está a iniciar uma vida a dois, é importante salientar alguns cuidados devem ser tomados. Um deles é o de procurarem manter o seu espaço individual e de casal: um equilíbrio entre o espaço pessoal (espaço do eu), o espaço a dois fruto da relação (espaço do nós) e o espaço social (espaço da rede). 


Ao fazer assim, o casal logo no início da união, não só estará a prevenir ou atenuar dificuldades do percurso a curto, médio e longo prazo, como continuar a manter atividades, interesses, relações individuais e pessoais que dão sentido e equilíbrio a ambos. Ao terem filhos, o casal precisa de preservar o espaço, físico e emocional, bem como as suas atividades e os seus interesses particulares, sem a participação e interferência dos filhos. O casal ao manter esses espaços, ao chegarem à fase que já podem ficar autónomos, os filhos já terão o hábito de estar sozinhos e se autonomizarem, permitindo assim que os compromissos e os prazeres individuais e de casal sejam salvaguardados.


Um outro cuidado muito importante no casamento é a necessidade em manter a intimidade, a cumplicidade, a sexualidade e os projetos a dois, dialogando sobre cada um deles ao longo do ciclo da vida da família. Assim, o casal que investe e se propõe a manter e desenvolver a vida íntima entre si, não irá ter dificuldade em mantê-la ou até mesmo enriquecê-la na fase tardia da relação. 


O exercício constante e persistente em manter a linguagem do prazer e da sexualidade expressão do amor que os une, em aprender sempre na relação e alimentar a cumplicidade entre os dois, apesar dos altos e baixos da vida a dois, será recompensado na fase tardia da relação. O desenvolvimento e a execução de projetos comuns, materiais ou de outras áreas, mantêm o casal com um nível de ligação e de afeto que torna a relação mais íntima e mais funcional.


Não existem truques de magia que resolvam o aparecimento das dificuldades na relação, sobretudo quando essas mesmas dificuldades não foram consideradas e resolvidas de forma preventiva. O esforço em voltar a ser casal pode ser iniciado procurando retomar o que foi desejado por ambos em fases diferentes da relação e que na altura não foram atendidos, mas que agora podem ser reintegrados no percurso a dois. Para isso, o casal pode rever seus projetos, seus sonhos, seus desejos, aqueles que a vida e outras condições impediram de concretizar, poderão vir agora a ser atualizá-los e avaliar quais podem vir a ser retomados, quais podem vir a sofrer alterações desenhadas pelos dois.


Um outra boa forma de trabalhar a relação, é aprender o que não aprenderam nos anos anteriores. No excesso de atividades e responsabilidades que a vida vai exigindo do casal, não se presta atenção à possibilidade de aprender coisas novas e enriquecedoras para ambos. 
É por isso que esta fase apresenta-se por excelência, como a fase onde as coisas podem ser feitas em conjunto ou onde cada um de forma individual pode explorar novas atividades que se coadunem com as capacidades individuais do nós do casal, não menosprezando o facto de ser uma fase propícia para cuidarem do primeiro filho do casal: a sua união/casamento. 


Um outro aspeto a salientar é o facto de nos estarmos sempre a queixar por tudo o que é nos desagrada, que foge ao nosso controle e nos leva a sair da nossa zona de controlo (e a pandemia veio confirmar isso mesmo). Mais uma vez, o facto de não fazermos um bom uso do que nos faz sentir desadequados e até competentes, leva a que não possamos desenvolver novos conhecimentos e aprendizagens sobre nós mesmos, na via a dois e sobre tudo aquilo que nos rodeia. A fase do "ninho vazio" possibilita o facto de podemos retomar sonhos antigos que antes não eram realizáveis devido à falta de tempo ou disponibilidade.


Além disso é também muito importante retomar o espaço de intimidade, sob os mais variados ângulos: sexual, de partilha, de companhia. Nesta fase a dois, o casal pode retomar ou desencadear uma intimidade que dará um novo ânimo, uma nova perspectiva para suas vidas. Paciência, dedicação, surpresa e muito, muito diálogo são ingredientes necessários para reconquistarem-se a desejada intimidade. 


No âmbito individual, alguns aspetos podem ser realizados, desde o retomar um projeto de vida que tinha na adolescência; fazer um balanço de tudo aquilo que foi alcançado no decorrer da vida, tomar consciência sobre o que deixou de ser prioritário e importante e o que deixou de lado, mas que ainda deseja e procurar analisar o que gostaria que mudasse na sua vida.
Como casal esta fase, é propícia para avaliarem, de forma realista, o que aprenderam um com o outro (e dizê-lo concretamente um ao outro, pois se há coisa que aprendemos em casal, é que a telepatia não funciona muitas vezes!!), o que poderiam ter aprendido e quais as situações que os impediram de aprender e crescer enquanto casal. Além disso, será também importante analisar de que forma ainda podem vir a aprender com tudo aquilo que a vida lhes reserva e avaliar o que poderiam ter sido feito com a vicissitudes da vida ou o que os impediu de ter uma vida mais saudável, funcional e equilibrada. Podem ser muitos aspetos a considerar, contudo como pergunta uma amiga minha: "Como é que se come um elefante? R: Dentadinha, a dentadinha...!!"


E enquanto pais/avós podem também realizar algumas reflexões: começando por avaliar o que, no seu papel parental poderia ter feito melhor; analisando o que pode atrapalhar as relações com os filhos hoje já adulto e talvez pais; mudando e acrescentando itens para criar uma relação com os filhos e os netos, de forma a ter aconchego afetivo, poder acompanhar o desenvolvimento das próximas gerações e enriquecer as relações familiares onde exista proximidade, convivência, dedicação, reciprocidade e respeito.


by Susana Silva